domingo, 1 de fevereiro de 2009

Eule

Geralmente posto poemas nesse blog, e prosa no outro "Corpo Ambulante", mas dessa vez vou inverter. Quem quiser poesia, confira no meu outro blog. Ai vai:

Eule

    Se sentia inferior por não usar óculos, e todos os seus amigos viciados em leitura usavam. Seu herói usava. Ele caminhava atentamente avoado, no mundo da literatura. Olhava para o céu e as estrelas, e de fato as lia como poemas. Talvez sofresse, pois o mundo caminhava mais rapidamente do que suas leituras. Será que se importava? Como Cruz & Sousa, tinha só um amor. Como Gonçalves Dias amava o Sabiá, e a sua pátria. E agradecia por não ter sua Olímpia.
    Ele simplesmente cansou do mundo. Fechou os olhos para a realidade sem graça e os abriu para as metáforas. Seu maior sonho era virar um livro. Um romance, talvez. Contos não, pois seria muito breve. Não queria ser Crônica pois não queria ser cômico nem cotidiano. Nem muito menos denunciador. Sim, queria ser complexo como um poema Épico, prazeroso como um Romance de Machado de Assis. Interessante como André Vianco, e com um humor leve, sem ser bobo...o humor de Douglas Adams.
    Quando dormia, sempre levava um livro para a cama. Ler antes de dormir era o seu ritual. Aos poucos o sono invadia a mente. Se não o fizesse, não dormia. E a insônia o dominava, não que achasse ruim: insônia gerava poemas, contos, crônicas, enfim, literatura. Na maioria das vezes, ficava com só um livro. Mas não raramente, pegava mais um. Lia um pouco dum, depois doutro. E quando o sono vencia as linhas e páginas, colocava o livro, ou os livros, debaixo do travesseiro. Incomodava um pouco a cabeça, mas gostava deles lá. Protegidos por ele. Até que ao acordar, conferia se estavam lá, como uma criança que procura o resultado de ter colocado o dente debaixo do travesseiro, sua oferenda para a Fada do Dente.
    Continuou assim. Mais tarde, psicologicamente talvez, achou sua doença nos olhos. Agora usa óculos. Está mais feliz, é verdade. Ainda ler o céu, ainda tem seu amor único, e dorme com seus livros.




7 comentários:

CA Ribeiro Neto disse...

Hermes, agora temos mais um integrante do blog's de quinta: João Henrique - http://oamortecesonhos.blogspot.com/

Adcione ao grupo! hehe

Jajá venho ler!

p.s.: tinha que ser na quinta! hehehehe

Mila Cardozo disse...

Gostar de usar óculos... ta ai uma coisa que eu nunca irei entender... hauahuahaua
Beijos Mila

CA Ribeiro Neto disse...

Depois te conto do curto espaço de tempo em que usei e detestei óculos!

Muito massa o conto! Eu quero ser um livro de crônicas e você pegou pesado com as coitadas... hehehehe

Paulo Henrique Passos disse...

Bom mesmo, ó.

A Literatura tem mesmo a funçao de transportar a outra realidade, ou mostrá-la de uma vez. Isso pra mim, muitas vezes é confortante.

O ruim é que esses caras, que nem o Eule, são tidos como idiotas, só poque enxergam além da realidade, só porque sonham.

Abraço!

João Henrique disse...

Gostei do no nome do personagem. Eule. Tudo a ver com o conto.

Ah, prazer... João. heheh

João Henrique disse...

Entendi algo do tipo "Eu leio" e vi nitidamente o personagem com óculos grandes e rosto redondo.
Muito clara a imagem dele.

Thiago César disse...

conto bacana!
pena q eu nao tenho tanta paixao assim pela leitura...
:(